10/02/12

Pena Capital


Entre nós e as palavras há metal fundente
entre nós e as palavras há hélices que andam
e podem dar-nos morte violar-nos tirar
do mais fundo de nós o mais útil segredo
entre nós e as palavras há perfis ardentes
espaços cheios de gente de costas
altas flores venenosas portas por abrir
e escadas e ponteiros e crianças sentadas
à espera do seu tempo e do seu precipício



Ao longo da muralha que habitamos 
há palavras de vida há palavras de morte 
há palavras imensas, que esperam por nós 
e outras, frágeis, que deixaram de esperar 
há palavras acesas como barcos 
e há palavras homens, palavras que guardam 
o seu segredo e a sua posição 

Entre nós e as palavras, surdamente, 
as mão e as paredes de Elsinore 

E há palavras nocturnas palavras gemidos 
palavras que nos sobem ilegíveis à boca 
palavras diamantes palavras nunca escritas 
palavras impossíveis de escrever 
por não termos connosco cordas de violinos 
nem todo o sangue do mundo nem todo o amplexo do ar 
e os braços dos amantes escrevem muito alto 
muito além do azul onde oxidados morrem 
palavras maternais só sombra só soluço 
só espasmos só amor só solidão desfeita 

Entre nós e as palavras, os emparedados 
e entre nós e as palavras, o nosso dever falar 

Mário Cesariny " Pena Capital "

2 comentários:

Respirem fundo e desabafem,:)