Não penses. Que
raio de mania essa de estares sempre a querer pensar. Pensar é trocar
uma flor por um silogismo, um vivo por um morto. Pensar é não ver. Olha
apenas, vê. Está um dia enorme de sol. Talvez que de noite, acabou-se,
como diz o filósofo da ave de Minerva. Mas não agora. Há alegria
bastante para se não pensar, que é coisa sempre triste. Olha, escuta.
Nas passagens de nível, havia um aviso de «pare, escute, olhe» com
vistas ao atropelo dos comboios. É o aviso que devia haver nestes dias
magníficos de sol. Olha a luz. Escuta a alegria dos pássaros. Não
penses, que é sacrilégio.
Vergílio Ferreira, in "Conta-corrente - nova série - 2"
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